Precisamos (voltar a) falar sobre o Johnny Depp

2017 vem sendo um ano de muitos (des)acobertamentos em Hollywood. Depois de Kevin Spacey ser acusado de assédio sexual por vários atores e equipe que trabalharam com ele, o New York  Times ter publicado uma lista com mais de 100 denúncias de assédio de atrizes, modelos e funcionáriasHarvey Weinstein  e mais recentemente existirem também acusações de estupro feitas a Ed Westwick (tem post mais detalhado sobre isso aqui) - e muitos mais outros casos -, decidimos que também devemos nos posicionar e não proteger determinadas pessoas porque gostamos/idolatramos/amamos seus personagens em séries ou em filmes.


Vamos ao caso Johnny Depp: em junho do ano passado, sua - até então - esposa, Amber Heard, acusou o ator de agredi-la diversas vezes, sendo a última antes de pedir o divórcio. Amber chegou a divulgar até mesmo um (aviso de gatilho) vídeo onde Johnny atirava uma garrafa de vidro ao chão, batendo em armários e sendo extremamente agressivo com ela.

Logo após o pedido de divórcio, Amber também pediu uma ordem de restrição. No processo de divórcio, foram divulgadas algumas fotos onde Amber aparecia com o rosto machucado. Como resposta a isso, os advogados de Depp disseram que a divulgação das fotos foi “uma resposta à atenção negativa que a atriz recebeu após abrir o divórcio”. Além disso, diversos amigos e parentes de Johnny acusaram Amber de chantagem e de mentir para se promover

Após alguns meses, o divórcio foi finalizado em forma de acordo e a atriz retirou as queixas. Ela doou todo valor que recebeu do ator (cerca de 7 milhões de dólares) à instituições que tratam da violência contra a mulher. Vale lembrar que no comunicado conjunto que esclarecia o divórcio, os dois disseram que nunca houve qualquer intenção de danos físicos e emocionais

Sobre a cultura machista e misógina em Hollywood, Amber falou há pouco tempo: "Eu já tinha percebido que as raízes da misoginia são mais profundas e onipresentes. Eu não me dei conta disso até um ano e meio atrás. Eu vivia com a cabeça enterrada na areia porque eu fazia comparações com outros lugares ou com o passado. Eu não percebia o quão longe precisamos ir para sermos iguais". 

Em maio desse ano, foi divulgado que Depp chegou a recusar um roteiro da franquia "Piratas do Caribe" porque possuía uma mulher como vilã. Além disso, nesse meio tempo, também lançou os dois filmes da franquia "Animais fantásticos e onde habitam", de JK Rowlling. Já Amber Heard, que estrela a Liga da Justiça, é constantemente atacada e desmoralizada por ter se imposto em um caso de violência doméstica. E o que tiramos disso? Apesar da acusação da Amber, a vida profissional (e pessoal!) de Depp em nada foi afetada, enquanto ela ainda é tratada como se não fosse nada além da ex-esposa de Johnny Depp, que se usou da situação para se promover.  

Particularmente (e acho que falo pela Bruna e pela Milk também), não acredito que seja possível separar a vida pessoal e profissional de qualquer artista. Não dá pra condenar o que o Johnny Depp fez em relação à Amber e outras situações misóginas e continuar a assistir os filmes dele ou curtir as fotos dele da década de 80. Infelizmente, casos graves - como acusações de estupro por parte de Woody Allen - aconteceram e acontecem em Hollywood e raramente são apurados e os responsáveis culpabilizados. 

Pessoas públicas também são capazes de cometer violência doméstica. O artigo de Marcello Oliveira, no Sobre Sagas, tem uma passagem muito interessante: 

"Suponha que você tenha em sua empresa um homem que é agressivo, que agride, estupra ou violenta mulheres, mas é um bom funcionário, continuaria com ele lá? O mesmo se aplica a Depp. Ele pode até ser um bom ator (embora isso seja contestável), mas como ser humano, é agressivo. (...) A sociedade de uma forma geral (pessoas, empresas, instituições) devem repudiar em todos os sentidos qualquer tipo de agressão/agressor contra qualquer grupo social que já é estruturalmente oprimido (nesse caso, mulheres). E repudiar um famoso agressivo significa sim pedir pela perda de influencia, pressionar canais de mídia, expor acontecimentos passados, e não querer que ele participe de uma franquia bilionária que o daria mais reconhecimento e visibilidade."

Esse post é uma gotinha em um oceano de discussões sobre misoginia, culpabilização da vítima, violência contra a mulher e tantos outros temas, mas espero que tenha colocado na sua cabeça as seguintes dúvidas: por que sempre duvidamos da mulher? Por que o homem sempre sai impune das situações?

Se você se interessa pelo tema, indico a leitura de um artigo da Susy Freitas que fala sobre a cultura do estupro no cinema, o de Amaury Terto sobre as perguntas (machistas) feitas sobre o caso Amber Heart, e o vídeo do Renie Santos sobre o Johnny Depp em "Animais fantásticos".

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